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Alhos e Bugalhos

Written by

Beda

Que é fácil confundir termos técnicos e denominações com as quais não estamos habituados, sem dúvida é sim. Quando tratamos de vinho, então, tão “recente” para o povo brasileiro – ou ainda, tão desconhecido para a IMENSA maioria – há confusão constante e muita. Me entristece porém que o próprio pessoal do meio estimule confusão e gere ainda mais bagunça. É fato que, num mercado tão novo, o “pessoal do meio” seja também um tanto… despreparado.

Foi com alguma alegria que ouvi hoje, da boca de um respeitado especialista, que ele considerava o Manoel Beato o melhor sommelier do país não à toa: ele é sem dúvida capacitado e experiente, mas o destaque, de acordo com o especialista, vai para o fato de que, entre o pessoal da “velha guarda”, ele é o único que se mantém no salão.

Isso faz de alguém um bom sommelier? Sem dúvida. Na verdade, isso faz de alguém um sommelier. Embora tenha caído no uso do brasileiro designar como sommelier praticamente todo profissional do vinho, sejamos inteligentes: não confundamos alhos com bugalhos.

De acordo com o Oxford Companion to Wine – a referência bibliográfica máxima do mundo do vinho, organizado pela inglesa Jancis Robinson – sommelier é o “garçom ou atendente especializado em vinho. O trabalho do sommelier é garantir que qualquer vinho pedido seja servido corretamente e, idealmente, aconselhar sobre as características de cada vinho na carta do estabelecimento e sobre a harmonização entre vinho e comida.

Nos lugares em que o vinho faz parte do dia-a-dia do povo, sabe-se com algum discernimento: há quem faça vinho, quem venda vinho, quem prove vinho, quem estude vinho e quem sirva os vinhos nos restaurantes. Não é assim tão difícil, vá: “Diferentemente de enófilo, que é quem gosta de vinho, de enólogo, que tem diploma de enologia e é responsável pela elaboração da bebida, e especialista (ou enologista), que entende do assunto, sommelier é o profissional encarregado do serviço do vinho nos restaurantes” escreve Jorge Lucki, no Valor Econômico (de 15/05/2007).

Às vezes fico desanimado com a realidade do mercado brasileiro. “Garçon” por aqui não é profissão, é trabalho – qualquer desocupado pode fazer – e os refinados meio-intelectuais que gostam de bares meio-ruins (quem não leu sobre isso ainda tem que ler: reza a lenda que é do Antônio Prata, mas no blog dele não tem busca) valorizam isso, ou seja, não dão o menor valor à função. Afinal, basta ir até a mesa, anotar o que o cliente quer, pedir na cozinha e trazer de volta, não é???

“Não é, porém, só isso. É fundamental que o profissional responsável pelos vinhos de um restaurante tenha muita habilidade no trato com o cliente. É saber aproximar os que têm receio de se expor, ter paciência com os mal humorados, levar com classe os aspirantes a “connaisseur”, e, principalmente ganhar credibilidade ao manter longe a imagem de que ele está lá para empurrar vinho (caro)”, continua Lucki.

De garçonzeco a sumaliê é só um pulo, então vemos por aí um mar de nego-à-toa que quer saber é de aumentar o troco no bolso e não de aprender a fazer o trabalho bem-feito. E chamem-me do que quiserem: conhecer vinho NÃO é pra qualquer um, ainda que, se beber fosse para todos, seria uma beleza. Exige uma dedicação da peste, conhecimentos gerais amplos, boas noções de geografia, um mínimo de conhecimento de línguas estrangeiras e TEMPO. Haja tempo. O pior: é caro pra caramba, especialmente – mas não exclusivamente – no Brasil.

Masquei meu sapo de hoje e ainda abri espaço pra me livrar de um rascunho de mais de ano. Como o assunto é polêmico e já levei bronca pelo tamanho dos posts, o resto fica pra o próximo.

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  1. eta produção bonita! 3 posts numa sentada:)

    não consegui acessar o artigo da alexandra…

    Sobre o penúltimo parágrafo, nem me fala! Quanto mais leio e tento aprender, mais descubro o quão pouco sei. E se na teoria estou no nível iniciante,na prática mal entrei no jardim de infância…
    beijo.

  2. A propósito deste assunto e da Alexandra Corvo, viu a carta dela prá Veja desta semana? …"ideal é me chamar de sommelière."

    1. Não vi, onde tem???
      Fato é que todos os "sommeliers" minimamente qualificados do país abandonam o barco assim que têm uma chance. Ninguém quer ficar lidando com os caras chatos do salão, trabalhar até de madrugada e passar horas em pé quando pode fazer um milhão de outras coisas por aí. Eu que nunca fui sommelier larguei o salão antes que me fizessem um! Mas ou você é, ou você não é.

  3. Ué… Na seção de cartas da Veja! Reproduzo abaixo prá vc:
    "Gostaria de deixar registrado que, apesar de ter formação em enologia, não sou enóloga. Enólogo é o profissional que produz vinhos, e esse não é meu ofício. Fui durante anos sommelière de restaurantes e hoje ensino a profissão em minha escola. Assim, o ideal é me chamar de sommelière.
    Alexandra Corvo
    São Paulo, SP"
    Ainda bem que há gosto prá tudo, né? O que seria de nós, pobres mortais analfabetos do vinho sem os sommelieres?

  4. Li tudo o "sobre mim" e ri demais. É muito bom ler coisas sensatas como as que escreve e ainda assim conseguir rir. Adorei seu blog. Ganhou mais uma leitora! Abraços.
    P.S: não consegui colocar o endereço de blog mesmo sendo do Blogspot.

    1. Gil,

      fico feliz. A idéia é justamente esta: compartilhar coisas de forma interessante e autêntica. Às vezes eu acho que exagero, mas é bom que as pessoas se divirtam, pelo menos!

      Quando ao blog, o meu usa o sistema WordPress, não o Blogspot. Mesmo assim, esquisito!! Você pode sempre colocar seu endereço na mensagem. Fico esperando, pra poder te fazer uma visita.
      Abraço e obrigado,
      Bernardo

  5. Só a título de curiosidade: já que estamos falando de uma palavra francesa, consultando nosso grande, ou melhor, nosso Le Petit Robert, temos:

    >> sommelier, ière n.

    1¨ Anciennt Personne qui a la charge de la table et des vivres, dans une maison, une communauté.

    2¨ (1812)  Mod. Personne chargée de la cave, des vins dans un restaurant. = caviste.

    3¨ N. f. Région. (Suisse) Sommelière : serveuse de café ou de restaurant.

    Ou seja, a Alexandra na Suíça viraria uma simples e reles garçonete! De café ou restaurante…

    Um abraço!

  6. olá. por que você se acha qualificado de falar sobre a sommelerie sendo que nunca foi? trabalhou em uma "padaria-bistro"?
    fraco,hein…

    1. Hehehe. Provavelmente, sim: fraco, talvez demais. Obrigado pela visita e pelo comentário. Vamos lá, então:
      "Achar-se" qualificado é uma situação delicada, não é?
      Eu me acho qualificado por ter trabalhado com serviço, eventos e atendimento durante 6 anos e vir exclusivamente atuando no mercado de vinhos há 3. Por ser um consumidor atento. Por observar e ouvir as pessoas que são consideradas referências e ler o que elas e outras escrevem. Por viajar e visitar restaurantes em todo lugar em que posso estar. Mas essa é só minha opinião! Pra felicidade dos que não gostam das minhas críticas, não sou legislador, nem professor, nem responsável pela categoria, então até aqui, a minha qualificação pra falar de sommelierie, se existe, existe somente na minha própria mente.
      Mas, o mais importante: não me considero um sommelier qualificado. Não me auto-denomino sommelier, justamente por não ter a formação, experiência e prática necessárias e, obviamente, por não exercer a função. E, de fato, criticar é muito mais fácil que fazer: criticando, me mantenho na posição fácil e segura, mas procuro refletir sobre as críticas e contribuir para o debate.
      Espero que tenha sido claro e que você possa ler este comentário. Seu e-mail cadastrado não existe, então não pude notificá-la da publicação… Espero notícias!

  7. olá, meu nome é alexandra corvo. gostaria de entender porque estão falando de mim? conheço algum de vocês? ou alguém de vocês me conhece? parece que há dúvidas sobre o fato de ser sommelière. Esclarecendo, trabalhei como tal por 8 anos em restaurantes na Suíça e aqui na cidade de SP. E antes disso, trabalhei uns 5 anos como garçonete. Gostaria de informar ao "Claudius" que não há nada de "reles" nem de "simples" em ser garçonete – todo o contrário. É parte importante de minha carreira e tenho muito orgulho de ter trabalhado em restaurantes e cafés. O senhor não deve saber do que está falando.

    1. Alexandra,
      obrigado pela visita e pelo comentário. Vamos lá então:
      antes de tudo, em nenhum momento questionou-se sua capacitação profissional ou formação, que sei – inclusive por conhecer você e seu trabalho pessoalmente – estarem fora de debate. Seu nome surgiu em função do conteúdo de dois meus artigos: este, que criticava os profissionais lambões que se auto-denominam sommeliers e a grande confusão que se faz em torno do termo e o fato de que um dos leitores do blog leu uma carta sua à Veja em que comentava sobre sua "denominação" profissional logo após ter lido um outro, em que eu mencionava um artigo de sua autoria (http://bsmp.com.br/2008/12/12/leram-nossos-pensamentos-ragazzi/).
      Quanto ao "Claudius", que conheço pessoalmente, errou talvez em pensar que o público entenderia a ironia como ele sabia que eu entederia: ele tem plena consciência de que eu trabalhei como garçon durante muito tempo e mais ainda!!! ELE mesmo fez as vezes de serveur no mínimo algumas vezes!!!
      Não se preocupe: não se tratam aqui de ataques pessoais e sim de pessoas trocando idéias, ainda que algumas vezes possa soar meio… agressivo?
      Beijo e volte sempre,
      B.

  8. Ber, tenho acompanhado os comentários e confirmo minha opinião de que é difícil prá caramba botar nas palavras o verdadeiro sentimento que se quer transmitir, assim como é extremamente fácil quem lê não entender esse sentimento ou, pior, entender errado.

    Reli os dois posts e acho que o que incomodou a Alexandra foi comentário do Claudius, o que comprova minha frase aí de cima. Fora isso, não haveria razão para ela questionar o fato de o nome dela aparecer. Fala-se dela assim como do Lucki e poderíamos ter citado o Copello ou algum outro. Quem ensina sobre vinho, assim como qualquer outra matéria, deve saber que os alunos gostam de citar os mestres.

    Eu, pessoalmente, conheço pouco do trabalho dela, mas do pouco que conheço posso afirmar que ela dá um baile em muitos profissionais do vinho que andam por aí – alguns apenas pretensos, o que comprova teu ponto.

    beijo.

  9. agressivo não. desrespeitoso e ignorante em relação à profissão dos garçons. isso sim. ainda não sei quem é vc, mas agradeço a resposta. o meu comentário na Veja se deu por conta de uma matéria onde eu indicava vinhos, na edição anterior àquela, em que me deram o "título" de enóloga, ao lado do meu nome. A carta foi para esclarecer a errata da revista, e não por outro motivo.

  10. Olá caros amigos do blog!

    Vamos por partes, como diria Jack. Antes de mais nada, peço desculpas a quem tenha se sentido ofendido(a) com meu comentário. Em hipótese alguma quis ser desrespeituoso a ninguém. Como o nosso próprio Beda falou, fui irônico no comentário ao dizer "simples e reles" graçonete, mas creio que nao o suficiente para o entendimento de todos. Como ele mesmo disse, eu mesmo fui graçom onde ele trabalhou e não escondo de ninguém esse fato. Entrei simplesmente no mérito literal dos termos abordados, mas parece que tenho que aprimorar minha ironia. Mais uma vez, não estou aqui para questionar a capacidade de niguém. Estou aqui para passear pelos salões do palacete e me divertir, informar e trocar informações com outros apreciadores do vinho.
    Bom, fiquem tranqüilos, tomem um bom vinho e apreciem os novos posts e comentários.

    Um abraço a todos,
    Claudio.

    ps: caso, ainda assim, continuem a achar o comentário anterior desrespeituoso, ignorante ou agressivo, peço ao nosso Buda ó Beda que retire o (in)feliz da lista.

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